Escala bucólica de Brasília: O que torna a cidade única 

Criada por Lúcio Costa para organizar a cidade em diferentes níveis de funcionalidade, essa escala compreende todos os espaços livres e verdes no Plano Piloto

Dentre as inúmeras características que tornam Brasília única, sua qualidade de Cidade-Parque é a que melhor a define. Existem, atualmente, cerca de 5,5 milhões de árvores em todo o Distrito Federal, e mais de 1 milhão delas estão no Plano Piloto. Há ainda, mais de 180 milhões de metros quadrados de grama e 650 jardins em áreas públicas e oficiais. Todos esses espaços, que também permeiam e envolvem as Superquadras e Entrequadras, os diversos setores e os conjuntos de casa e comércios locais, compreendem a Escala Bucólica da cidade, criada por Lúcio Costa por volta de 1958.

Conforme explica Iuri Cesário Araújo, professor de Arquitetura e Urbanismo no Centro Universitário UNICEPLAC, “a escala bucólica pode ser definida como a escala urbana da natureza, dos espaços livres e verdes no Plano Piloto de Brasília, cuja função é promover a qualidade de vida urbana, contemplação, convivência e a socialização entre os habitantes, além de integrar as demais escalas urbanas (residencial, gregária e monumental)”. Como destaca o profissional, ela é composta, de maneira geral, por áreas verdes livres com vegetação maciça (árvores, arbustos, forrações) e são destinadas principalmente à preservação ambiental, ao paisagismo e ao lazer. E isso é o que Brasília tem de sobra, né? São exemplos de espaços representantes desta escala: (1) o canteiro central do Eixo Monumental; (2) os cinturões verdes (com 20 metros de largura) que circundam cada Superquadra; (3) o Parque da Cidade; (4) a Praça dos Cristais (no Setor Militar Urbano); (5) o Parque Olhos d’água e (6) o Lago Paranoá (Espelho D’água). 

Uma pausa para respirar 

Morador da Asa Sul, o advogado Marcelo Pascale procura no Parque da Cidade, um refúgio para se desligar um pouco da rotina de escritório. Para ele, o local detém de imenso valor, e é um privilégio tê-lo tão perto de casa. “Moro aqui há 10 anos e sempre que quero desopilar, desancar um pouco, venho aqui, geralmente no final da tarde. Esse lugar traz muita leveza para a cidade, e fica só a 10 minutos de caminhada da minha casa”, compartilha. “Eu valorizo muito lugares como o Parque da Cidade. Pelo projeto e pelo ideário social da sua construção. O lugar é muito arborizado e acredito que isso seja fundamental, principalmente para a questão da purificação do ar. O clima aqui é muito seco e isso equilibra um pouco as coisas”, avalia o advogado de 55 anos.

Por ter sido criada há muitos anos atrás, essa escala, bem como as demais, é constituída apenas pelas áreas verdes dentro das Asas Sul e Norte, Vila Planalto, Vila Telebrasília, Cruzeiro, Octogonal, Sudoeste e Candangolândia. Ela foi idealizada para desempenhar o papel de organizar a cidade em diferentes níveis de funcionalidade, e tem suas características e propósitos únicos. 

Devido ao fato de não poderem ser modificadas, elas são consideradas um dos maiores feitos do urbanismo segundo a Unesco. “O valor cultural da escala bucólica pode ser percebido pela conexão direta entre a vida social do cidadão e o valioso ambiente físico vivenciado. A predominância dos elementos verdes sobre o espaço construído é uma das características mais marcantes que constituem a identidade de Brasília”, pontua Iuri Araújo. “A escala bucólica contribui substancialmente para a qualidade visual da cidade, além de ser fator preponderante na composição da paisagem urbana histórica, que faz com que Brasília seja excepcional nesse sentido”, acrescentou o professor. 

“O que se vê aqui, não se vê em outro lugar” 

Ipês-amarelos, roxos e brancos, quaresmeiras, sucupiras, aroeiras, copaíbas. Lírios, sálvias vermelhas e azuis, zínias, cravos, petúnias, sampatios, iresines, moreias. Anualmente, o DF desenvolve mais de 80 de espécies de flores, mais de 300 espécies de arbustos, de plantas de sombra e palmeiras, além de mais de 200 tipos de árvores, em que 60% são provenientes do cerrado. “Isso é um grande diferencial nosso. Brasília é peculiar por ter sido planejada desde a sua gênese e por conter amplas áreas verdes que permeiam todo o seu tecido urbano, integrado ambiente natural e construído. Além da questão cultural e estética, o espaço verde é determinante quanto aos aspectos bioclimáticos e ecológicos, tornando Brasília um ambiente mais saudável”, explicou Iuri. 

Conforme descreve Raimundo Silva, chefe do Departamento de Parques e Jardins (DPJ), o que se vê em Brasília, não se vê em nenhum outro lugar. “Temos em Brasília uma floresta urbana que não existe em nenhum outro lugar no mundo, com índice de área verde acima de 50 metros quadrados por habitante”, afirmou. Toda a produção e manutenção desses espaços é coordenada pela Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap), por meio do DPJ. 

Morando em Brasília há 4 meses, a mineira Renata Silva Guimarães, que está morando no Lago Norte, adora levar a família para conhecer as belas áreas verdes da cidade. Caminhando pela Praça dos Cristais, no Setor Militar Urbano, ela e a família não economizaram nos elogios para o lugar. “As pessoas sempre, quando vem turistar, vão sempre nos pontos turísticos mais comuns, que também são lindos, mas deixam de conhecer belas paisagens como essa”, comentou a servidora pública. “Eu estou encantada. É tudo muito lindo e muito bem planejado. Acho muito importante a cidade ter lugares assim para trazer a família e aproveitar o dia”, acrescentou a mãe, Maria Júlia Guimarães.

Número 1 em qualidade de vida 

Toda essa estrutura analiticamente pensada em unir beleza e bem-estar gera para a cidade grandes títulos. Recentemente, por exemplo, Brasília liderou o ranking de desempenho em qualidade de vida, segundo o levantamento IPS Brasil 2024, divulgado na  última quarta-feira (3).

O estudo considerou fatores como nutrição, saúde, moradia, saneamento, segurança pessoal, acesso à informação, meio ambiente, inclusão social, liberdade individual e acesso à educação superior. O Distrito Federal, segundo a pesquisa, apresentou melhor desempenho em acesso à informação e comunicação; saúde e bem-estar; direitos individuais; liberdades individuais e de escolha; acesso à educação superior e, claro, qualidade do meio ambiente.

Por Mayra Dias do Jornal de Brasília

Foto: Mayra Dias / Reprodução Jornal de Brasília