O Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) multiplicou em 13 vezes a quantidade de militares responsáveis por combater os incêndios no Parque Nacional de Brasília, iniciados no último domingo (15/09). A equipe, que na segunda-feira (16/09) contava com 50 bombeiros, totalizou 650 combatentes na tarde desta terça-feira (17/09). Outros mil militares permanecem de prontidão nos quarteis, em caso de necessidade. Eles são responsáveis pelo rescaldo e pela vigilância dos locais ainda atingidos pelo fogo.
Profissionais do Instituto Chico Mendes (ICMBio) e do Brasília Ambiental (Ibram) também estão na linha de frente do enfrentamento ao fogo, que já queimou 2,4 mil hectares da vegetação da unidade de conservação. O Exército auxiliou no deslocamento das equipes e na disponibilização de caminhões pipa.
Até a tarde desta terça-feira, as chamas que tomaram conta do Parque Nacional nos últimos três dias estavam controladas, mas ainda não haviam sido extintas, conforme informou o coronel Pedro Aníbal, comandante operacional do CBMDF. Isso porque dois focos de incêndio, difíceis de combater, demandavam a atenção das equipes nas matas de galeria da região. Essa vegetação acompanha córregos e cursos de rios de pequeno porte, formando corredores fechados sobre as águas.
Em coletiva de imprensa no fim da tarde de ontem, o coronel Marcos Rangel, do CBMDF, destacou que, apesar do controle sobre o fogo, esse incêndio que atinge as matas de galeria é mais complexo. “Tem mais profundidade e isso dificulta o acesso, mas contamos com cinco bombas de água e carros do Exército.”
O satélite responsável pela transmissão das imagens da área atingida envia fotografias no período noturno. Nas fotos de segunda-feira, não foi possível identificar o total da área queimada. Portanto, ontem o quantitativo de hectares permaneceu em 2,4 mil. Esse número poderá ter mudanças hoje.
João Morita, coordenador de manejo integrado do ICMBio, explicou que o trabalho de ontem focou no monitoramento das linhas para evitar reignições. Não houve resgate de animal ferido e o especialista ressaltou que há áreas com rotas de fuga e abrigos para casos mais graves. “De 42 mil hectares, 2 mil foram atingidos. Nossas equipes estão em campo, com o monitoramento constante e combate nas áreas afetadas”, informou.
Além dos 650 bombeiros, o ICBMBio atua com cerca de 60 brigadistas, mais 10 brigadistas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e 10 do Instituto Brasília Ambiental (Ibram). A operação conta, ainda, com um helicóptero da PM e dois aviões do ICMBio.
Técnicas de combate
“Focos de incêndio em matas de galeria são subterrâneos e podem atingir até 2 metros de profundidade. É um trabalho árduo e demorado, no qual não é possível ver o fogo, apenas a fumaça saindo de alguns pontos”, completou o coronel. As equipes do Corpo de Bombeiros se deslocaram por viaturas até os locais mais próximos dos focos de incêndio e, a partir daí, fizeram o caminho até o fogo a pé. Apesar de o órgão possuir duas aeronaves de pronto emprego e drones — utilizados para o reconhecimento das áreas em chamas — não é efetivo utilizá-los em caso de muita fumaça.
“Nossa preocupação é o aumento da temperatura e a diminuição da umidade que ocorre no decorrer da tarde. Então, vai ser preciso cuidado para esses focos não se propagarem novamente”, alertou o comandante Aníbal. Por parte dos militares, a técnica empregada para conter esses incêndios inclui contornar os pontos de fumaça com aceiros e jogar bastante água. A equipe também utilizou uma motobomba para, com a água do córrego do Bananal, fazer os resfriamentos e o rescaldo dessas áreas.
A queima prescrita é outro método que auxilia a controlar o fogo, servindo como barreira natural às demais queimadas. Todo esse trabalho leva em conta dados técnicos, análise de vento e eventual propagação das chamas. Caso o incêndio se expanda nas matas de galeria, corre-se o risco de haver mais queimadas em áreas preservadas.
Situação crítica
Segundo dados do CBMDF, até a primeira semana de setembro deste ano, foram registradas mais de 11 mil ocorrências de incêndios florestais, 29% a mais do que o montante contabilizado em todo o ano de 2023. Na segunda, o fogo se alastrou rapidamente no Parque Nacional, fazendo com que o trabalho dos combatentes virasse a noite.
“Ontem (segunda-feira), foi o dia mais crítico desde domingo. Estamos fazendo análises de algumas áreas para evitar a reignição do fogo. Além da vegetação, estamos preocupados com as casas dos servidores que vivem próximos ao parque”, afirmou o presidente do ICMBio, Mauro Pires.
Há preocupação grande com a fauna, porém, ainda não foram registradas mortes ou fugas, visto que a prioridade é combater os incêndios. Pires reforçou que o fogo só pode ser declarado extinto quando não houver mais risco de ignição. Além disso, não é possível precisar quando ele será extinto.
O presidente do ICMBio ainda destacou a importância da investigação, declarando que o incêndio tem todas as características de uma atitude criminosa. “Famílias foram impactadas com a fuligem e com a fumaça, além das consequências econoômicas, em vista da grande mobilização de equipes, cujo recursos poderiam ser usados em outras atividades”, completou.
Larissa Diehl, chefe do Parque Nacional, afirmou que a mata de galeria não tem condições de se recuperar tão facilmente, além de ser uma vegetação fundamental no que se refere à água que abastece o DF. “A barragem de Santa Maria, por exemplo, abastece 45% da água do DF e pode ter impactos na quantidade e na qualidade. Vai ser preciso fazer trabalhos de restauração e a recuperação será lenta”, avaliou.
Criado em 29 de novembro de 1961, o Parque Nacional de Brasília possui uma área de 42.389,01 hectares e abrange as regiões administrativas de Brasília, Sobradinho e Brazlândia e o município goiano de Padre Bernardo. A unidade de conservação surgiu da necessidade de proteger os rios que fornecem água potável à capital federal e de manter a vegetação em estado natural.
Rotina exaustiva
À frente das operações de combate, bombeiros do DF enfrentam uma rotina árdua nesse período. O Correio conversou com dois militares, que detalharam como lidam com o trabalho no Parque Nacional. A primeiro sargento Mônica Amado, 48 anos, especialista em combate a incêndio florestal há 16 anos, explica que a expectativa é de um trabalho realmente duro, mas que os militares estão acostumados a esse nível de exigência.
Ela cita que os maiores desafios nesses incêndios florestais, especificamente neste ano, é o vento. “Ele está sendo muito forte. Além da vegetação, que está muito seca e muito alta, porque no ano passado não tivemos um período de secura como está sendo agora. Então, a dificuldade que não tivemos no ano passado, agora está sendo bem maior.” Apesar da árdua função, os bombeiros que chegam para operar nos combates são militares já descansados. “Estamos chegando para render os militares que estão lá dentro desde ontem. Essa tropa que está aqui, neste momento, está descansada e fisicamente revigorada.”
Os bombeiros utilizam equipamentos especiais para esse tipo de serviço, como a balaclava mais grossa, máscara full face e equipamento de proteção respiratória. O sargento Felipe Farias, 31, acredita que os incêndios florestais estão aumentando a cada ano. “Estamos vivendo um período muito delicado, que depende muito do ano anterior. Como no ano passado choveu de forma atípica em Brasília, o mato cresceu muito. Este ano, estamos enfrentando uma seca acima da média, então temos uma combinação de fatores que permitem que o que está acontecendo agora ocorra.”
Para quem acha que o combate é fácil, o sargento explica. “É um fogo que percorre cerca de 1 ou 2 metros abaixo do solo (combate subterrâneo). Temos que, literalmente, cavar, encontrar esse fogo e aplicar algumas técnicas de combate, como a inundação.”
*Contribuíram Letícia Guedes e Luis Fellype Rodrigues
Ocorrências de incêndios florestais no DF
2020: 9.093
2021: 9.352
2022: 9.943
2023: 8.836
2024: 11.415*
*Dados coletados até 10/09
Fonte: CBMDF
Por Letícia Mouhamad e Darcianne Diogo do Correio Braziliense
Foto: Ed Alves/CB/D.A Press / Reprodução Correio Braziliense