Mesmo com o clima frio, a chegada da seca no Distrito Federal alerta para a necessidade de reforçar a preparação no combate aos incêndios florestais. A proximidade de áreas urbanas com unidades de conservação em Brasília exige atenção redobrada, segundo João Paulo Morita, coordenador do Centro Especializado em Manejo Integrado do Fogo do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e integrante da Rede Biota Cerrado da Universidade de Brasília (UnB). O especialista foi entrevistado de ontem do programa CB.Agro, parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília. Na conversa com os jornalistas Carlos Alexandre de Souza e Roberto Fonseca, Morita falou sobre os desafios e as estratégias para enfrentar esse período crítico, o reforço nas equipes, a importância da colaboração da população e as perspectivas para 2025. Confira os principais trechos da entrevista:
Brasília tem áreas naturais muito próximas a zonas urbanas. Como o senhor avalia essa proximidade?
O Parque Nacional de Brasília está cercado pela cidade, com bairros como o Noroeste e o Lago Oeste. A Floresta Nacional fica próxima a Ceilândia. As cidades estão cada vez mais perto das áreas naturais, o que aumenta nossa preocupação, mas também a necessidade de articulação com outras instituições do Estado, como o Corpo de Bombeiros e as escolas, por meio da educação ambiental. Precisamos nos estruturar melhor e fortalecer parcerias com as instituições presentes nesses territórios. No ano passado, por exemplo, houve um grande incêndio na Floresta Nacional de Brasília, justamente em um dia com muitos turistas e ciclistas. Todos precisaram ser evacuados com apoio de diversas entidades.
As pessoas também são diretamente afetadas, certo?
Sem dúvida. O incêndio do Parque Nacional de Brasília, no ano passado, gerou uma grande quantidade de fumaça que chegou ao Plano Piloto. O mesmo aconteceu com o incêndio na Floresta Nacional, que afetou Ceilândia e Taguatinga. Esses eventos têm impactos sérios na saúde da população.
Como está a situação da seca e dos incêndios neste ano, em comparação com o ano passado?
As chuvas já cessaram, e o clima tende a ficar cada vez mais seco. Ainda estamos com temperaturas relativamente baixas, mas a tendência é de aumento nas próximas semanas, o que eleva o risco de incêndios não só no DF, mas em várias regiões do país. Este ano tem sido um pouco mais tranquilo em comparação a 2023 e a 2024, quando enfrentamos muitas ocorrências por conta do El Niño. Mesmo com essa aparente melhora, os incêndios ainda acontecem e precisamos estar preparados para combatê-los.
A expectativa, então, é de um ano com menos queimadas?
É possível. Em julho de 2024, por exemplo, estávamos com uma grande operação em andamento no Pantanal, com a mobilização de brigadistas, bombeiros, Ministério da Defesa e aeronaves. Neste ano, ainda não tivemos essa escala de resposta. No entanto, há um deficit hídrico acumulado entre 2023 e 2024 que não será resolvido rapidamente, mesmo com as chuvas recentes. Por isso, o nível de atenção deve continuar o mesmo.
Quais outros biomas ou áreas preocupam neste período?
O ICMBio atua, principalmente, em unidades de conservação federais, como parques e florestas nacionais. Entre os biomas, o Pantanal merece atenção especial devido ao histórico recente de incêndios. O Cerrado, por sua vez, é naturalmente suscetível ao fogo. A Amazônia tem registrado cada vez mais ocorrências por causa das mudanças climáticas e da alteração no uso do solo. Caatinga, Mata Atlântica, Pampa — todos os biomas têm suas particularidades e requerem vigilância constante.
Houve aumento na contratação de brigadistas este ano?
Sim. Tanto o Ibama quanto o ICMBio planejaram aumentar o efetivo de brigadistas em 2025, com um reforço de aproximadamente 25%. O Ibama atua principalmente em terras indígenas e quilombolas, enquanto o ICMBio se concentra nas unidades de conservação. Portanto, há previsão de um contingente maior para este ano.
Como é feita a interação com comunidades tradicionais e produtores rurais, que também lidam com o fogo?
O incêndio tem um custo alto para toda a sociedade — afeta a saúde da população urbana, prejudica grandes produtores e causa danos ambientais. No entanto, o fogo, quando usado corretamente, é uma ferramenta econômica para pequenos agricultores e comunidades tradicionais. Nosso objetivo é dialogar com esses grupos, entender suas necessidades e contribuir com soluções seguras.
Quais tecnologias têm sido utilizadas no monitoramento e combate ao fogo?
Desde 1998, o INPE utiliza satélites para monitorar focos de incêndio. A tecnologia evoluiu muito desde então. Hoje, há uma constelação de satélites que detectam os focos rapidamente. Além disso, a inteligência artificial tem sido incorporada, com o uso de câmeras que identificam sinais de fumaça e emitem alertas em tempo real. Isso agiliza a resposta e aumenta a precisão.
Como a população pode colaborar?
Principalmente por meio da educação. As pessoas podem participar dos programas de voluntariado do ICMBio, ajudando nas ações na Floresta Nacional e no Parque Nacional de Brasília. Existem também projetos voltados para pesquisa e outras iniciativas. Para participar de programas ambientais, acesse o site do ICMBio e confira as informações disponíveis.
Ajuda da população é fundamental
Com o período de seca se intensificando no Distrito Federal, os riscos de incêndios florestais aumentam drasticamente. As altas temperaturas, a baixa umidade do ar e o acúmulo de matéria orgânica seca, como folhas e galhos, criam o cenário ideal para o fogo se espalhar rapidamente. Diante desse quadro, a participação da população é essencial para prevenir tragédias ambientais, proteger vidas e conservar o Cerrado.
A prevenção começa com pequenos gestos. Não jogar bitucas de cigarro em áreas de vegetação, evitar queimadas para limpeza de terrenos e nunca soltar balões são atitudes fundamentais. O uso do fogo é proibido por lei no DF, inclusive, para fins agrícolas, durante o período crítico da estiagem, que vai de maio a setembro.
Moradores que vivem perto de áreas verdes podem ajudar realizando a limpeza preventiva dos quintais e não acumulando lixo ou entulho próximo à vegetação. Outra boa prática é manter aceiros, faixas de terra sem vegetação, em torno de chácaras e lotes, o que ajuda a conter a propagação do fogo.
Além da prevenção, a denúncia rápida é uma das principais armas contra o fogo. Ao avistar qualquer sinal de fumaça ou princípio de incêndio, a orientação é ligar imediatamente para o Corpo de Bombeiros pelo telefone 193. A população pode denunciar crimes ambientais, como queimadas ilegais ou desmatamentos, ao Instituto Brasília Ambiental pelo telefone 162, pela Ouvidoria-Geral do DF ou pelo site www.ouvidoria.df.gov.br. Denúncias anônimas são aceitas.
Voluntariado também faz a diferença. O Distrito Federal conta com brigadas voluntárias, formadas por cidadãos capacitados para atuar no combate direto a focos de incêndio. O curso de formação é oferecido anualmente pela Secretaria do Meio Ambiente (Sema-DF) e parceiros do Sistema Distrital de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (PPCIF). Além disso, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMIO) tem editais que recebem brigadistas voluntários.
*Estagiária sob a supervisão de Eduardo Pinho
Por Resenha de Brasília
Fonte Correio Braziliense
Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press