Como parte de processo investigativo instaurado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) para apurar a conduta dos dois policiais civis responsáveis por abordagem truculenta na Asa Norte, na quarta-feira, foram solicitadas à Corregedoria-Geral da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) informações sobre o ocorrido para que o órgão possa acompanhar de perto o andamento do processo. A corporação tem 10 dias para fornecer as informações requisitadas.
A PCDF terá que fornecer ao MPDF o número do procedimento administrativo disciplinar instaurado, as fichas funcionais dos policiais envolvidos, a confirmação de que os policiais foram afastados de suas funções, o número do inquérito policial e a portaria inaugural. Caso ainda não tenha inquérito, o MP requisita a sua instauração.
Além disso, o MPDF pediu que sejam realizadas, entre outras, as seguintes diligências investigativas: vídeos divulgados nas reportagens jornalísticas sobre o caso, solicitação das imagens de câmeras de monitoramento da região onde se deu a abordagem, depoimentos da vítima e da genitora da criança, identificação e oitiva de testemunhas presenciais, eventuais documentos e registros produzidos em procedimento instaurado em desfavor da vítima, caso existente e laudo de lesões corporais da vítima.
Relato
Ao Correio, Diego Torres Machado de Campos, 42 anos, relatou os momentos de tensão que precederam a abordagem truculenta. “Eu estava andando pelo Eixão Norte, na altura da quadra 115 Norte, quando esse carro descaracterizado entrou na minha frente e começou a pisar no freio bruscamente. Até que, em um determinado momento, houve um mínimo contato entre os dois veículos. Fiquei assustado, desviei e acelerei rumo à tesourinha da 114 Norte”, detalhou. “Como tem muito maluco no trânsito e a viatura estava descaracterizada, fiquei com medo. Até que eles ligaram uma sirene. Demorei a perceber que vinha de lá. Me esquivei e entrei no eixo W até chegar na 112 onde eu pudesse parar com um pouco mais de segurança e descer do carro e me explicar e resolver toda a situação”, continuou.
Diego disse ainda que as agressões verbais começaram assim que os policiais desceram do carro. “Desceram me xingando, dizendo que eu estava maluco, que eu bati numa viatura e que eu estava preso. Eu imediatamente pedi que alguém me ajudasse, pelo menos, a acudir meu filho, que alguém pudesse avisar a mãe dele e que ela pudesse vir buscá-lo. E eles falando que eu devia ter pensado nisso antes de acelerar, com seu filho dentro do carro e tudo mais”, relatou. “Eu não levantei minha voz em nenhum momento, eu saí numa boa querendo resolver a situação”, acrescentou.
Questionado sobre o motivo da perseguição por parte dos policiais, Diego diz que ainda tenta entender a razão. “Eu acho que foi só uma pessoa que simplesmente não gostou de ver o meu carro passando por ele na faixa da esquerda. Acho que foi só isso”, disse.
No momento da abordagem, os policiais fecharam a porta do carro nas pernas do filho de Diego. “As pernas dele ficaram vermelhas. Eu fiz exame de corpo de delito, mas ele não fez. Meu filho ainda está muito assustado com tudo”, contou.
Desabafo
A jornalista Gabriela Furquim, mãe da criança, falou com a reportagem do Correio e detalhou como se sentiu quando recebeu a ligação avisando o que tinha acontecido. “Uma mulher me ligou pelo telefone do Diego dizendo que o Tito estava sozinho. Meu primeiro medo foi de que ele estivesse machucado, mas disseram que ele estava bem, só assustado”, contou. “Quando cheguei ao local, a primeira pessoa que veio falar comigo foi o policial de branco. Disse que o Diego tinha cometido um crime grave. Vi meu filho desolado, abraçado com pessoas desconhecidas. Foi muito duro. Mas eu não sei o que teria acontecido se não fossem essas mulheres, sou muito grata”, continuou.
Filho único de pai e mãe e neto único das duas famílias, o menino Tito ainda está assustado com tudo. “Ele não precisou de atendimento médico, está tranquilo. Ele não tem falado o tempo todo sobre o assunto, mas está mais sensível, não quer ficar sozinho. Está de férias da escola, mas nesses últimos dias, não quis ir à colônia de férias. Estamos passando a maior parte de tempo possível com ele”, afirmou. “De ontem para hoje, tenho ficado mais abatida. A ficha vai caindo. Não é normal ter uma polícia que age assim, seja com quem for”, concluiu.
Testemunha
A reportagem conversou ainda com uma das pessoas que estavam no local e ajudaram a acolher a criança. A testemunha, que não quis ser identificada, conversou diretamente com um dos policiais envolvidos no início da abordagem na tentativa de acolher a criança. “Eu presenciei eles retirando o motorista de dentro do carro com enforcamento. Para mim, não foi uma briga de trânsito, não teve briga. Ficou claro que era uma pessoa desequilibrada que abusou da atividade profissional que tem. Ele usou violência para lidar com uma situação simples”, ressaltou. “Mantiveram ele cerca de 10 minutos com o rosto no asfalto e algemado. Ele também foi derrubado no chão na frente da criança. Questionei qual seria o processo com relação à criança, ele ficou me mostrando a arma, me empurrou em vários momentos. A sirene era muito alta, era difícil dialogar”, relembrou.
Apoio
O Sindicato dos Policiais Civis do Distrito Federal (Sinpol-DF) saiu em defesa dos dois policiais envolvidos. “O Sinpol-DF entende, com base na análise preliminar dos relatos e elementos disponíveis, que a conduta dos policiais civis seguiu os protocolos operacionais da corporação, especialmente diante de uma situação de fuga e resistência à abordagem”, disse o presidente do sindicato, Enoque Venancio de Freitas. “É essencial considerar o contexto integral da ocorrência e não se limitar a recortes de vídeos ou interpretações parciais que circulam nas redes. O sindicato confia na apuração técnica e isenta por parte da Polícia Civil e demais órgãos competentes”, completou.
O Sinpol-DF colocou o Departamento Jurídico à disposição dos policiais civis envolvidos e está acompanhando o caso de perto. “O sindicato seguirá acompanhando com atenção todos os desdobramentos e estará ao lado de cada policial civil que atua com ética, responsabilidade e compromisso com a verdade — valores essenciais para a preservação da segurança pública e da confiança da sociedade.
Por Revista Plano B
Fonte Correio Braziliense
Foto: Material cedido