Eu queria criar um espaço para conversas, construtivas e transformadoras. Um local para que pessoas criativas pudessem se encontrar e colaborar”, conta Marcela Rossiter, de 27 anos, dona da Livraria, Café e Espaço Cultural Glória, que vende, apenas, obras literárias de mulheres e de pessoas trans. Localizada no Bloco C da CLN 313, a livraria une culinária, cultura e literatura em um só ambiente. “A ideia de fazer um café também é não só financeira, para garantir a sustentabilidade do espaço, mas pelo meu interesse em gastronomia”, contou a livreira.
Com um acervo potente, decoração aconchegante e bem brasileira, a Glória foca na valorização dos artistas. “Durante a faculdade, fiz pesquisas nas quais estudei a posição de mulheres diferentes dentro da arte e cultura brasileira, o que me fez, anos depois, criar a Glória”, lembra Marcela, que batizou o espaço com o nome da avó. Segundo ela, que morou em São Paulo e se inspirou em algumas livrarias que frequentou na cidade, é preciso inovar para ter sucesso em um mundo tão tomado pela velocidade dos meios digitais. “Eu acredito que esse caminho de ter uma curadoria selecionada e uma proposta diferente é uma forma de bater de frente com as grandes empresas de tecnologia que têm atacado o mercado editorial”, defendeu.
Convivência
Também na Asa Norte, outro espaço inova ao vender livros. Com câmeras fotógraficas antigas, CD’s e vinis, a Baixo Norte é uma livraria que trabalha com compra e venda de exemplares. No local, que parece uma verdadeira viagem no tempo, também acontecem feiras vintage, eventos de artistas plásticos e fotografia, como conta o livreiro Artur Cavalcante, de 33 anos. “Vale a pena, para eu ter um espaço para receber as pessoas e promover os eventos, criando essa rede de pessoas que tem os mesmos interesses. Tenho conseguido, cada vez mais, fazer isso por aqui”, conta. Há um ano funcionando na CLN 411, a Baixo Norte atrai quem passa na quadra comercial, com sua decoração descolada e incentiva um passeio entre as prateleiras da loja. “Acho que precisamos estimular na sociedade o hábito da leitura”, pontuou Artur. “Estamos muito presos aos vídeos no dia a dia. Precisamos dar um passo para trás nessa velocidade da máquina e reorganizar melhor os pensamentos”, completou.
Assim como a Baixo Norte, a livraria Circulares, na CLN 313, também tem uma agenda cheia, mas com rodas de leitura e lançamentos de obras dos escritores que vendem seus exemplares no espaço. “A gente quer ressoar os temas que estão nos livros e que mais pessoas gostem de ler e falar das suas leituras. É muito interessante como, mesmo fora dos eventos, as conversas entre os leitores são construídas. Alguém pega um livro da prateleira, e outra pessoa diz que leu e conta das suas impressões, e uma conversa casual vai acontecendo”, ressaltou Camile Marques Sahb, 52, dona da Circulares.
Quem atende os clientes no local, todo dia, é Gabriel Pagliuso, 24, que conta que trabalhar como livreiro é sobre estar constantemente aprendendo. “Tenho que buscar, sempre, pesquisar e ler sobre as obras que são publicadas e sobre nosso acervo. Muita gente vem aqui e busca dicas de livro, sugestões, então tenho que saber o que sugerir”, conta. “Tem clientes que vêm procurando um título específico, mas têm muitos que sentem, leem por horas aqui. O ambiente favorece esse conforto, esse espaço para tirar um tempo do dia e aproveitar uma boa leitura”, completou.
Referência
Desde 1975, quando chegou à Universidade de Brasília (UnB), Francisco de Carvalho, 65 — ou Chiquinho, como é conhecido—, viu dezenas de gerações de calouros em seus anos no ICC Norte. De sua banca, ele observou a popularização dos computadores, dos celulares, dos kindles e da inteligência artificial. Mesmo em meio à rapidez e fluidez das informações, sua livraria permaneceu procurada e respeitada no ambiente acadêmico. “Recebo, aqui, muitos jovens, entre 18 e 26 anos, que estão cansados e assentados pelas telas. Eles sentam, a gente conversa e indico livros”, conta Chiquinho, que é otimista sobre a permanência das mídias físicas. “Então eu otimizo o futuro e quero que o leitor volte a ter o prazer de ir até uma livraria, sentar e escolher uma obra. Acho que isso é insubstituível”, ressaltou.
O espaço é local de lançamentos de autores, de rodas de conversas e debates dentro da universidade. Além disso, a Livraria do Chico tem um caráter afetivo, pelos alunos que o visitam todo dia entre as aulas. A historiadora Sarah Resende, 34, conheceu Chico quando estava em sua primeira graduação, em 2009. Hoje, 16 anos depois, ela ainda frequenta a livraria para papear com o amigo. “Não é só a figura da livraria em si, mas a do livreiro. Se você precisa de um livro em uma determinada área, ele vai saber te indicar”, contou Sarah. Assim como a historiadora, a estudante de agronomia Amanda Alves, 18, também encontrou na livraria um lugar para boas conversas. Em seu primeiro semestre na UnB, a caloura fez amigos por meio dos bate-paposn a banca. “Sempre que eu tenho um tempo livre, venho para cá. O Chico tem ótimas histórias, não só da UnB, mas de Brasília como um todo. É impressionante, ele olha pra sua cara e já sabe qual livro te indicar”, conta a aluna.
Conheça as livrarias
- Glória Livraria de Rua, Café e Espaço Cultural — CLN 313 BL C 60/70, Instagram @gloriasanorte
- Baixo Norte Livros e Discos — CLN 411 BL E Loja 29, Instagram @baixonorte
- Circulares Livros — CLN 113, BL A, loja 7, Instagram @circulares.livros
- Livraria do Chico — Instituto Central de Ciências, na UnB, Instagram @livrariadochico
Por Resenha de Brasília
Fonte Correio Braziliense
Foto: Bruna Pauxis