Relatório da Polícia Federal (PF) divulgado na quarta-feira (20/8) revelou mensagens recuperadas do celular do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Em prisão domiciliar desde 4 de agosto, o réu teve o celular apreendido na mesma data. As mensagens foram apagadas antes da operação, mas é possível recuperar.
Segundo documento assinado por servidores da inteligência da PF, as mensagens “recuperadas pelo software de extração de dados, permitindo a análise e contextualização com os fatos sob apuração”. Parte das mensagens de texto foram recuperadas, mas a repartição não conseguiu o mesmo feito com os arquivos multimídia. “Isso se deve ao fato de que o banco de dados do WhatsApp não armazena os arquivos multimídia em si, mas apenas seus metadados — como nome do arquivo, caminho no sistema de arquivos, tipo de mídia e data/hora de envio”, diz o relatório. Play Video
O professor de engenharia da informação Mário Gazziro, da Universidade Federal do ABC (UFABC), explica que esse procedimento é feito por um aparelho externo, um software de computador disponível apenas para a Polícia e outros serviços de inteligência governamentais do mundo inteiro. O primeiro passo após a apreensão é isolar aquele aparelho.
Para entender essa recuperação, o especialista ressalta que uma informação é essencial: “o celular ele não apaga nada, aquele pedacinho da memória está vago e aí quando ele precisar de algum espaço efetivamente, ele vai lá e escreve por cima”.
“É como se você tivesse uma estante de livros, a estante é o seu celular e os livros são as informações”, exemplifica. “Aí você define que você vai jogar fora todos os livros da primeira prateleira de cima, mas só se chegarem mais livros novos, você não joga efetivamente. Quando chegam livros novos, aí sim você joga fora, que é o sobrescrever que acontece no celular.
Por isso, quanto mais recentes e mais leves forem os arquivos, mais fácil de serem recuperados. O tamanho do arquivo é também um dos fatores que explica porque os textos são mais fáceis de serem recuperados do que os áudios e vídeos.
Mensagens criptografadas
Outro quesito que pode gerar dúvidas é segurança dos aplicativos de mensagem. No caso do WhatsApp e de outros apps, as mensagens são protegidas por um sistema de criptografia de ponta a ponta, que permite que apenas o remetente e o destinatário tenham acesso ao conteúdo.
Isso que dizer que nem a Meta, empresa responsável pela rede social, nem os órgãos governamentais podem interceptar as mensagens. No caso das mensagens de Jair Bolsonaro, os peritos não utilizaram mecanismos para burlar a criptografia, já que eles tinham o próprio dispositivo em mãos.
“A criptografia de ponta a ponta protege o meio do caminho, mas não proíbe que alguém que teve acesso ao seu celular fisicamente consiga pegar um backup”, explica Gazziro. “Se a Polícia tivesse interceptado essa mensagem do Bolsonaro chegando para alguém, eles não iam conseguir abrir, mas, no celular dele, eles conseguem, por isso apreensão”.
Bolsonaro indiciado
As mensagens recuperadas fazem parte de relatório enviado pela PF ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à Procuradoria-Geral da República (PGR) que indicia o ex-presidente e o filho Eduardo Bolsonaro por “coação no curso do processo”.
A conclusão da polícia aponta ainda o crime de “abolição violenta do Estado Democrático de Direito”. Além de pai e filho, o relatório aponta a participação do jornalista Paulo Figueiredo e do pastor Silas Malafaia. A investigação cita a atuação do 03 na articulação com os Estados Unidos para impor sanções ao Brasil sob justificativa de perseguição contra o pai.
Bolsonaro já é réu no STF por organização criminosa, golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O ex-presidente faz parte do chamado Núcleo 1 na tentativa de golpe, que passa por julgamento na primeira turma da corte a partir de 3 de setembro. Além dele, integram o grupo o deputado federal e ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem (PL-RJ), o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno, o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e o ex-ministro da Casa Civil e vice de Bolsonaro em 2022, Walter Braga Netto.
Por Resenha de Brasília
Fonte Correio Braziliense
Foto: AFP