Pacotes de viagens estão entre as opções mais procuradas ao planejar a ida a um destino turístico. Muitos consumidores têm essa preferência devido à facilidade de, em um só lugar, numa única negociação, poderem contratar traslados, passagens aéreas, hospedagem, passeios e — eventualmente — até guia e refeições. Mas essa aparente zona de conforto pode trazer surpresas desagradáveis, quando a pessoa ignora detalhes. Algumas empresas e agências que oferecem esses serviços concentrados, acabam fornecendo dores de cabeça ao invés de satisfação.
Foi o que aconteceu com Gustavo Alves e sua tia Marineide Alves. Eles, que acreditavam haver contado com um assessoramento correto para saírem em uma viagem feliz, na qual levariam outros parentes e com os quais dividiram esse custo, acabaram saindo lesados. Juntos, compraram um pacote, em datas abertas, para Santiago, no Chile, que incluía os voos de ida e retorno ao Brasil.
Feita a aquisição, Marineide e Alves enviaram três sugestões de datas para a empresa. A companhia, porém, disse que nenhuma delas estava disponível e apresentou outras que sequer se aproximavam às dos períodos que os clientes propuseram. Devido a isso, alguns familiares desistiram do passeio e pediram o dinheiro de volta a ambos. Tia e sobrinho, contudo, decidiram manter a compra e persistiram, mais duas vezes, na busca de dias que os atendessem, objetivo que não alcançaram com o vendedor.
Após um ano e meio, desde que contrataram o pacote que não puderam usufruir, eles exerceram o direito de desistirem da compra — com prevê o Código de Defesa do Consumidor (CDC) — e pediram reembolso. A empresa informou que isso ocorreria em até 60 dias úteis. Acontece que a data-limite para esse depósito foi alcançada sem que o dinheiro nunca voltasse. “Eles falaram que o meu pedido de reembolso tinha sido encaminhado ao departamento financeiro e que eu iria receber. Isso jamais ocorreu. Estou no prejuízo até hoje”, desabafa o sobrinho.
Atenção
Ao planejar uma viagem, é importante fazer pesquisas sobre a agência antes de contratar o serviço de turismo. “O primeiro passo é pesquisar a reputação da empresa. Isso pode ser feito consultando as avaliações dos consumidores e eventuais registros de reclamações no Procon”, explica o especialista em direito do consumidor Jorge Leal.
De acordo com ele, o segundo passo é recolher o máximo de informações sobre o produto acordado, como por exemplo: data (da compra e da viagem), a companhia que fará o transporte, a cidade de destino, tipo de hospedagem e demais serviços (alimentação, traslados, seguro viagem etc).
Juliana Pullino Reis, advogada e mestre em Direitos Difusos e Coletivos, analisa que o ideal é buscar as instituições de defesa do consumidor. Porém, um caminho mais efetivo, pode ser abrir um processo judicial. Por ele, se consegue garantir, além da restituição do pagamento, até uma indenização por danos morais. Muitos tribunais entendem que essa compensação deve ser paga aos consumidores porque a empresa impôs a eles uma frustração, tanto por não havê-los atendido conforme o prometido quanto pela demora na solução do problema.
Juliana destaca que, na hora de contratar os serviços de viagem, o consumidor precisa tomar cuidado com ofertas e facilidades generosamente suspeitas e valores muito baixos. “O próprio Procon faz essa advertência sobre promoções”, lembra a advogada, citando o Instituto de Defesa do Consumidor.
Ela também aconselha a verificar se a empresa escolhida está registrada no Cadastro Oficial dos Prestadores de Serviços Turísticos do Brasil (Cadastur). “Essa informação indica se o fornecedor está em situação regular e em conformidade com a lei”, esclarece.
Além dessa checagem, a advogada diz que a leitura do contrato sobre o que será oferecido é essencial. No documento deve constar tudo o que foi acertado, como detalhes do serviço, informações sobre eventuais empresas terceirizadas que o fornecerão, preço, condições de pagamento, de cancelamento e de reembolso, identificação sobre quem tem a responsabilidade legal pela execução do trabalho e eventuais restrições à sua realização.
“As cláusulas que colocam o consumidor em desvantagem, como possibilidade de alterações dos hotéis, passeios e transporte, e possíveis incidências de taxas extras, exigem maior atenção. Por isso é importante guardar uma via com data e assinatura, além de todos os documentos que fazem parte do contrato, inclusive a publicidade”, destaca.
Condições
Amanda Ferreira escolheu um pacote de R$ 3,2 mil — divididos em uma entrada e oito parcelas — para viajar no início do ano. Ela atrasou um dos pagamentos, mas não deixou de fazê-lo, ainda que com multa. Porém, a poucos dias de embarcar foi surpreendida com o cancelamento de sua viagem, por não haver lido com atenção as condições de uso relativas ao serviço que adquiriu. “Quando se fecha o contrato é tudo muito lindo, mas não dão ênfase à cláusula referente a que, se atrasar algum boleto, a empresa pode cancelar a viagem”, aponta.
Mas ela não ficou no prejuízo. Conseguiu o reembolso do que havia pago, com juros, porque buscou ajuda na Justiça. “A juíza entendeu que eu havia sido passada para trás”, conta.
O consultor de turismo Luiz Câmara acrescenta que, quando um consumidor compra passagens aéreas, é importante solicitar ao vendedor informações sobre regras tarifárias aplicadas a esse serviço. Acrescenta que o cliente deve estar atento à resolução 400, da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), de 13/12/2016. “Ela estabelece que, se o consumidor estiver insatisfeito com a compra, ele tem direito a desistir dela, até 24 horas após fazê-la. A norma também garante o reembolso integral e sem qualquer multa, independentemente da regra tarifária da passagem”, explica.
A determinação da Anac também prevê que, quando a companhia aérea cancela ou altera a hora prevista da decolagem — sendo uma mudança superior a 30 minutos do horário original—, o consumidor também pode pedir seu dinheiro de volta ou remarcar a viagem, sem custos.
Dever
As agências de turismo também são responsáveis por qualquer transtorno surgido durante a viagem, como problemas na hospedagem ou passeios prejudicados pela falta de orientação prévia adequada. O CDC ressalta que a empresa é contratada para dar tranquilidade ao viajante e sua família.
Dificuldades que os consumidores possam ter resultantes de serviços mal prestados implicarão responsabilidade civil da agência de turismo. Isso porque elas são empresas que exercem uma atividade econômica de intermediação de trabalhos turísticos. Sendo assim, a correta atuação delas está regulamentada no código.
Direito
O Procon estabelece que clientes insatisfeitos com agências de turismo têm até 90 dias, após a contratação do serviço, para pedir providências ao órgão. Se a entidade não conseguir resolver o problema, o consumidor pode buscar a Justiça. Nesses casos, é importante contratar um advogado, pois ele dará orientações muitas vezes desconhecidas por quem não é da área do direito.
O prazo para ajuizar um pedido de indenização por dano material e moral devido a falha na prestação dos serviços é de até cinco anos, a contar da data de aquisição do pacote de viagem, conforme está no CDC. Vale ressaltar que a ação não se restringe à empresa que vendeu o serviço. O processo incluirá, a depender da irregularidade, todos os demais envolvidos no pacote adquirido.
* Estagiária sob supervisão de Manuel Martínez
Cautela
» Leia o contrato com atenção.
» Certifique-se do valor da multa em caso de desistência.
» Antes de comprar um pacote, confira no site Cadastur — do Ministério do Turismo — se a empresa (ou o profissional) de turismo está registrado nele: gov.br/pt-br/servicos/pesquisarprestadores-de-servicos-turisticos.
Como reclamar
Quem se sentir prejudicado pode recorrer ao Procon e encaminhar a queixa. Também é possível reclamar pelo site consumidor.gov.br, que recebe denúncias de violações do Código de Defesa do Consumidor. É um serviço público que permite o contato direto entre clientes e empresas para tentar solucionar esse tipo de problema.
Por Correio Braziliense
Foto: Caio Gomez / Reprodução Correio Braziliense