Referência em educação, escola pública da Ceilândia aprova 70 alunos na UnB

Centro de Ensino Médio 9 de Ceilândia torna-se referência de boa educação, no DF, e aprova 70 alunos na universidade. Aulas extras e participação de ex-discentes ajudam no bom resultado

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O sonho de um futuro promissor foi alcançado por 70 alunos do Centro de Ensino Médio 9 (CEM 9) de Ceilândia, que foram aprovados para a Universidade de Brasília (UnB). Eles ingressaram por meio do vestibular tradicional, pelo Programa de Avaliação Seriada (PAS) e o Sistema de Seleção Unificada (Sisu). O sucesso dos alunos foi tão grande que alguns deles conseguiram acesso ao ensino superior por mais de um processo seletivo. 

Maria José Ferreira dos Passos, diretora da escola, comemora o resultado, mesmo diante das turbulências. “Não tem como não ficar contente, porque o nosso objetivo é que a escola se volte para o mundo da ciência, para a universidade, e os alunos que querem isso, se encaixam muito bem aqui.”

“Muitos professores do CEM 9 foram alunos do colégio, como eu, por exemplo. Depois, minha filha também estudou lá. Hoje, ela está no sexto semestre de medicina na UnB”, conta o vice-diretor Antônio Rafael da Silva Junior. “Nossos resultados mostram que existe uma luz no fim do túnel. Se a gente tiver um objetivo traçado, existe a chance de transformarmos vidas através da educação.”

Além das disciplinas da grade tradicional, o CEM 9 oferece aulões pela noite com ex-alunos que estão na graduação e monitorias aos sábados com os adolescentes que apresentam os melhores desempenhos da escola. Eles são estimulados a participarem das olimpíadas nacionais de ciências, e chegaram às finais de diversas competições.

Como incentivo ao ingresso no ensino superior, o colégio realiza visitas às faculdades parceiras. Segundo os docentes, a aprovação não foi maior, porque muitos alunos, acreditando não terem condições de se manterem na UnB durante todo o dia, por exemplo, por precisarem trabalhar, acabaram não prestando o vestibular.

Mudança de vida

Gabriel Costa, 17 anos, foi aprovado em dois cursos: ciências biológicas e agronomia, pelo vestibular tradicional e pelo PAS, respectivamente. Entre os dois, a paixão pela biologia falou mais alto.

O jovem é o primeiro da família a cursar o ensino superior. Os pais e a irmã têm apenas o ensino médio completo. “É um sentimento de virada, minha família tem uma história marcada por dificuldades e humilhações, então, meus pais ficaram orgulhosos, porque sentiram que a criação deles deu certo, e que depois de muitos acontecimentos ruins e de muita batalha, uma coisa boa aconteceu.”

Com a nova vida na universidade, Gabriel se prepara para enfrentar novos desafios. Vai ter de se deslocar da Ceilândia para o campus Darcy Ribeiro, na Asa Norte. Mas seus sonhos para o futuro são maiores — o garoto não quer trabalhar “dentro de um escritório”. “Esse planeta está sendo destruído e eu espero que, na faculdade, eles me mostrem como continuar vivendo nele”, projeta.

O colega Guilherme Alves, 18, também é o primeiro da família a ingressar em uma universidade pública. Passou para enfermagem tanto no vestibular tradicional quanto no PAS. “Acho uma área muito bonita, que exige o cuidado com a pessoa, com o enfermo, e eu aprecio muito a história da profissão.”

Alguns familiares, por parte de pai, que é consultor técnico de carros, ingressaram na faculdade, mas Guilherme é o primeiro da família por parte de mãe, autônoma da área da estética, a continuar os estudos. “A sensação de todos eles, é claro, é um orgulho muito grande, porque, hoje em dia, concluir o ensino básico e ingressar no ensino superior já é uma grande conquista.”

“Devido à demanda integral da universidade, e por causa do deslocamento, porque vou usar transporte público, vou ter que abrir mão do emprego”, explica. Para se manter estudando, os pais vão apertar mais o cinto para pagar as despesas dos alunos, até que Guilherme consiga uma bolsa de iniciação científica.

Exemplo dos mestres

Ana Luíza Figueira, 18, também foi aprovada em enfermagem e fisioterapia, ressalta o papel fundamental dos docentes do CEM 9 no seu processo de preparação, que além do incentivo nos estudos, também incentivavam que os alunos mantivessem uma vida social saudável para fora dos muros do colégio.

“Nós precisamos sair dessa bolha que colocaram a gente. Nos disseram que na Ceilândia só tem criminalidade e pessoas ruins. Precisamos mostrar para a sociedade que não é assim, que existem coisas muito melhores do que o que é noticiado sobre nós na televisão”, conta Ana.

Alto desempenho

Ana Beatriz Ferreira e Antônio Lucas de Araújo, ambos de 18 anos, foram aprovados para cursos de grande concorrência na UnB. Ana quer ser psicóloga e Antônio escolheu engenharia de software. “Pensava em continuar tentando depois de terminar o ensino médio, mas não tinha expectativa de entrar este ano. Quando vi que meu nome apareceu na lista, fiquei muito chocada”, comemorou a jovem.

Antônio terá de conciliar ainda mais uma atividade à rotina puxada dos outros colegas: o trabalho em uma empresa de TI. “No tempo livre que tinha, tentava estudar coisas que eu mais tinha dificuldade”, conta. Antônio quer se profissionalizar ainda mais na área em que atua e é apaixonado. 

*Estagiária sob a supervisão de Priscila Crispi

Por Lara Costa do Correio Braziliense

Foto:  Kayo Magalhães/CB/D.A Press / Reprodução Correio Braziliense